sábado, 16 de julho de 2022

Noel Rosa - 229 Gravações Originais

A coletânea levantada por Omar Jubran é preciosa por reconstituir a trajetória do gênio. No início de carreira, Noel foi influenciado pela música regional dos "Turunas da Mauricéia" -o grupo que veio do norte, constituído, entre outros, por João Pernambuco, Meira e Luperce Miranda. Eu já tinha ouvido as canções regionais de Noel em fitas que tenho em casa, reproduzindo a série "Nos Tempos de Noel Rosa", que Almirante gravou para uma rádio, não me lembro se a Nacional ou a Mayrink Veiga.

Noel também transitou pelo choro. Mas é considerado por muitos críticos o pai do samba moderno, o compositor que teria feito a transição do maxixe para o samba, o branco que fez a ponte com os compositores negros. De fato, Noel foi parceiro de Cartola e de Ismael Silva, no início dos anos 30. Mas, embora aqui no Brasil a gente valorize demais o "pioneirismo", me parece que Ismael, Cartola, Ari Barroso e outros também já produziam sambas que até hoje são contemporâneos.

Independentemente de seu pioneirismo ou não, Noel foi dos compositores fundamentais. Quando João Máximo escreveu sua biografia -em minha opinião a maior biografia já escrita sobre um músico popular no Brasil-, o compositor já estava reconhecido e consagrado. Emergiu do relato um personagem fascinante, cruel (capaz de botar fogo em mendigo), sentimental, ferino e, ao mesmo tempo, lírico, com todas as características que se juntam em uma pessoa brilhante, mas complexada pela deformação do queixo produzida por um fórceps malconduzido, no seu parto.

Com esse misto de ressentimento sem perder a esperança, de sarcasmo sem perder a doçura, o guerreiro capaz de se render a um mero aceno de carinho, Noel não foi apenas dos maiores compositores do país, mas aquele que mais se aproximou da alma brasileira.


The collection created by Omar Jubran is precious for reconstructing the trajectory of the genius. At the beginning of his career, Noel was influenced by the regional music of the "Turunas da Mauricéia" - the group that came from the north, formed, among others, by João Pernambuco, Meira and Luperce Miranda. I had already heard Noel's regional songs on tapes I have at home, reproducing the series "Nos Tempos de Noel Rosa", which Almirante recorded for a radio station, I don't remember if it was Nacional or Mayrink Veiga.

Noel also experienced crying. But he is considered by many critics the father of modern samba, the composer who would have made the transition from maxixe to samba, the white man who made the bridge with black composers. In fact, Noel was a partner of Cartola and Ismael Silva, in the early 30s. But, although here in Brazil we value "pioneering" too much, it seems to me that Ismael, Cartola, Ari Barroso and others also produced sambas that to this day are contemporaries.

Regardless of his pioneering spirit or not, Noel was one of the fundamental composers. When João Máximo wrote his biography -in my opinion the greatest biography ever written about a popular musician in Brazil-, the composer was already recognized and consecrated. A fascinating character emerged from the story, cruel (capable of setting fire to a beggar), sentimental, hurtful and, at the same time, lyrical, with all the characteristics that come together in a brilliant person, but complexed by the deformation of the chin produced by a forceps misguided, in its birth.

With this mixture of resentment without losing hope, of sarcasm without losing his sweetness, the warrior capable of surrendering to a mere wave of affection, Noel was not only one of the greatest composers in the country, but the one who came closest to the Brazilian soul.

Luís Nassif - Folha de São Paulo
03 de dezembro de 2000

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