Na adolescência, surgiram os primeiros experimentos coletivos, como os Beavers, grupo formado com irmãos e amigos como Beto Guedes. Ali, ainda sem plena consciência da dimensão que viria, já despontava a sensibilidade melódica que marcaria sua trajetória. Aqueles encontros caseiros abriram caminho para algo maior: a formação de um movimento que mudaria a música brasileira.
O Clube da Esquina nasceu justamente dessa convivência intensa, das madrugadas de violão e das conversas demoradas na esquina das ruas Paraisópolis e Divinópolis, no bairro Santa Tereza. Jovens como Milton Nascimento, Márcio Borges, Fernando Brant, Ronaldo Bastos, Toninho Horta e tantos outros encontravam ali um território de liberdade criativa. A contribuição de Lô foi essencial desde o início: sua juventude trazia ousadia, frescor e um olhar poético que iluminava harmonias inesperadas.
Em 1972, já no Rio de Janeiro, o grupo lançou o álbum “Clube da Esquina”, obra monumental que redefiniu a MPB. Lô, com apenas vinte anos, assinou oito faixas e ajudou a moldar a sonoridade que encantou músicos no Brasil e no exterior. A originalidade do disco chamou atenção de artistas do mundo inteiro, inclusive de Pat Metheny, que buscou entender o segredo daquele universo mineiro tão singular.
No ano seguinte veio “Lô Borges”, o famoso “Disco do Tênis”, uma explosão de juventude, autenticidade e inventividade que se tornaria um dos discos mais cultuados da música brasileira. A partir dali, sua obra cresceu de forma contínua, sempre guiada por delicadeza, risco criativo e profunda musicalidade. “Via Láctea”, “Os Borges”, “Nuvem Cigana”, “Sonho Real” e tantos outros trabalhos ampliaram seu território artístico.
Suas composições ganharam vida em vozes marcantes como Elis Regina, Gal Costa, Simone, Nana Caymmi e Milton Nascimento. “O Trem Azul”, escrita com Ronaldo Bastos, tornou-se um clássico absoluto, símbolo da poesia afetiva que guiava a geração do Clube da Esquina.
Ao longo das décadas, parcerias e encontros alimentaram sua produção: Caetano Veloso, Chico Amaral, Uakti, Samuel Rosa, Nelson Angelo, Makely Ka, Paulinho Moska, Patrícia Maês, entre outros. Lô explorou novos caminhos criativos, adotando tecnologias, trocando ideias por mensagens digitais, revisitando obras antigas e abrindo portas para experiências sonoras contemporâneas. Álbuns como “Rio da Lua”, “Dínamo”, “Muito Além do Fim”, “Chama Viva” e o EP “Hexágono” mostram sua inquietação constante.
Seus shows e reencontros com o passado, como as apresentações comemorativas do “Disco do Tênis” e o registro “Tênis + Clube ao Vivo”, aproximaram gerações e mantiveram viva a força original de sua música. Em 2024, com o single “Tobogã”, mostrou novamente a vitalidade de um compositor que nunca deixou de criar.
Em 2025, seguiu em apresentações pelo Projeto Sesc Pulsar, levando sua música a diferentes palcos e reafirmando o vínculo afetivo com o público. Sempre presente, sempre luminoso, sempre movido pela força discreta que caracteriza os grandes artistas.
Lô Borges faleceu em 2 de novembro de 2025, em Belo Horizonte, a cidade que o viu nascer, crescer e transformar poesia em canção. Sua partida deixou um silêncio sentido, mas sua obra continua a pulsar como uma chama permanente na cultura brasileira.
Seu legado permanece vivo: melodias que atravessam gerações, palavras que parecem brotar de dentro da terra mineira e uma sensibilidade que encontrou, na simplicidade, caminhos infinitos. Há artistas que desenham páginas na história; Lô Borges escreveu paisagens inteiras. E nelas sua música continua habitando, luminosa, sincera e eterna.
Lô Borges was born Salomão Borges Filho on January 10, 1952, in Belo Horizonte, in a home where music seemed to vibrate through the walls. Among twelve siblings, he grew up surrounded by melodies, conversations, and discoveries that transformed everyday life into raw material for art. Instruments were always within reach, and imagination had room to unfold freely.
During his teenage years, early musical experiments began to take shape, including the group The Beavers, formed with his brothers and friends like Beto Guedes. Even without fully realizing it, his melodic sensitivity was already evident, signaling the artistic force he would become. Those gatherings opened the path to something much greater: the birth of a movement that would reshape Brazilian music.
Clube da Esquina emerged from this intense coexistence, from late-night sessions with guitars and long conversations at the corner of Paraisópolis and Divinópolis streets in the Santa Tereza neighborhood. Young talents such as Milton Nascimento, Márcio Borges, Fernando Brant, Ronaldo Bastos, Toninho Horta, and many others found in that corner a territory of creative freedom. Lô’s contribution was essential from the start — his youth carried boldness, freshness, and a poetic sensibility that illuminated unexpected harmonies.
In 1972, already settled in Rio de Janeiro, the group released the monumental album “Clube da Esquina,” a landmark that redefined Brazilian popular music. At just twenty, Lô co-wrote eight tracks and helped shape a sound that captivated musicians in Brazil and abroad. The originality of the album caught international attention, including that of Pat Metheny, who became fascinated by the singular musical universe those young artists from Minas Gerais had created.
The following year came the iconic “Lô Borges,” the legendary “Tennis Album,” a burst of youthful authenticity and inventiveness that would become one of the most revered albums in Brazilian music. From there, his body of work expanded steadily, guided by subtlety, artistic risk, and deep musicality. Albums such as “Via Láctea,” “Os Borges,” “Nuvem Cigana,” and “Sonho Real” broadened his artistic landscape.
His compositions were embraced by powerful voices like Elis Regina, Gal Costa, Simone, Nana Caymmi, and Milton Nascimento. “O Trem Azul,” written with Ronaldo Bastos, became an essential classic, symbolizing the emotional poetry that marked the Clube da Esquina generation.
Across the decades, collaborations enriched his work: Caetano Veloso, Chico Amaral, Uakti, Samuel Rosa, Nelson Angelo, Makely Ka, Paulinho Moska, Patrícia Maês, and many others. Lô continued exploring new creative paths, embracing technology, composing through digital exchanges, revisiting earlier works, and expanding into new sonic territories. Albums such as “Rio da Lua,” “Dínamo,” “Muito Além do Fim,” “Chama Viva,” and the EP “Hexágono” reflect this restless spirit.
His concerts, especially the celebrations of the “Tennis Album” and the live recording “Tênis + Clube,” brought together multiple generations and kept his original creative spark alive. In 2024, the single “Tobogã” once again revealed the vitality of a composer who never stopped creating.
In 2025, he continued touring through the Sesc Pulsar Project, bringing his music to various stages and reaffirming the deep connection he maintained with his audience. Always present, always luminous, always driven by the quiet strength of true artists.
Lô Borges passed away on November 2, 2025, in Belo Horizonte, the city that witnessed his birth, growth, and transformation of poetry into song. His departure left a profound silence, yet his work continues to resonate as a permanent flame within Brazilian culture.
His legacy endures: melodies that cross generations, words that feel rooted in the soil of Minas Gerais, and a sensitivity that found infinity within simplicity. Some artists draw chapters in history; Lô Borges created entire landscapes. And within them, his music remains — luminous, sincere, and timeless.

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